terça-feira, 15 de outubro de 2013

A DECOMPOSICAO

A Decomposição

Já lá se vão, deveras, anos a fio, 
Em linhas, meu corpo é quem espera, 
O leito eterno sem estar no cio,
O tão curto fim de uma quimera.

Quem andava sempre teso à espera,
Caldaloso agasalho ao frio que sentia,
Não espirra mais o bem que é dela,
Já à porta dela chega e se desvia.

Agora, agasalhado, não sentirá frio, 
Com as linhas, teu corpo na gaveta,
Perdão, agora morto é quem espera,

Termina tua obra de putaria, 
Dormirá bem quente, o esqueleto,
Juntinho, bem grudado ao capeta.


De: Luiz Ferraz
Em: 15 de outubro de 2013
 

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

CABELO INTELIGENTE


Cabelo Inteligente

Cabeleireira, você é de profissão,
Pois dê um jeito em meu cabelo, bem assim...
Satisfazendo o gosto de meu pretendente,
Me faça agora esse tal “corte inteligente“
Para que mais eu goste dele, 
e ele, muito mais, goste de mim.

Daqui pra frente, não precisa perguntar, 
Tire mais aqui, e agora do outro lado,
Pois corte rente assim mais por fora,
Pare agora que é hora de pagar,
Pois seu trabalho é abençoado
E bem difícil de executar.

Agora mesmo, só quero é desse corte,
Inteligente, olhe que curto ficou,
Me peça, agora, amor, inté a morte,
Pois de tudo eu sei que eu te dou.
Gatinho, não existe mulher sem sorte,
Falta é homem quem te dê valor.


De: Luiz Ferraz
Em: 5 de setembro de 2013, em homenagem a Erica de Paula.

terça-feira, 2 de abril de 2013

CARTA A PAPAI


Carta a papai

Papai, faz hoje bodas de prata a tua partida,
Vinte e cinco anos fazem, hoje, que o senhor foi embora,
Sei da agonia que martiriza todo o seu dia
E uma tristeza que aperta o meu peito, agora.

Já faz, também, algum tempo que o senhor está me esperando,
Lamento dizer que ainda nao chegou a hora,
Mamãe, aqui comigo, com cuidado, ainda vai levando,
E já não é a mesma que o senhor conviveu outrora.

E a negrura dos meus cabelos que o senhor viu um dia,
Já não é a mesma que o senhor pode ver agora,
Me conte, aí, como vai titia?
Minha segunda mãe que tanto me adora.

Penso em vocês todos aí, desde o raiar do dia,
Mas à noite, a angústia da saudade em mim é quem chora,
Tento parar mas me impede uma melancolia,
No passeio eterno estão indo e eu ficando de fora.

Seus netos já estão todos bem criados,
Já não necessitam mais de minha velha mão,
Parece que os meus dias estao até mais contados
Pra que celebremos aquela nossa velha união.

Quero chegar pra te abraçar de cabeça fria,
Te mostrando que teu ensinamento nao foi em vão,
Que triste ficarei por mamãe me deixar um dia,
Mas alegre por saber que,voces dois, juntos estarão.

Ai, papai, que bom. Quando será o dia?
Me avise antes de um romper da aurora, então,
Sei que estaremos todos com muita alegria,
Pra que celebremos aquela nossa velha união.

Papai, com lágrimas  no rosto, teho que te deixar agora,
Pois os afazeres aqui em baixo não me dão mais trégua,
No fio de um prumo, retinho, espero a hora de ir embora,
Em elavador de circulo de compasso pois isso aqui é uma regra.

Um beijo grande para quem, contigo, me espera,
Em minha despedida, quem ficar, por favor, não chore nao,
Que minha presença, aqui em baixo, nao foi mais que uma quimera
E com minha, ausência, meu pai, celebraremos nossa velha união.


De: Luiz Ferraz
Em 2 de abril de 2013.

quarta-feira, 20 de março de 2013

O CONTO DO VIGARIO



O conto do Vigário

Dormia eu tão traquilo,
Na rede de um bom baiano,
Quando, sem esperar me deitar,
Toca aquele aparelho danado,
Viche, pois não é o celular...
Era Francisco me chamando,
Em ligação, e do Vaticano.

Pois diga aí, velho Chico,
O que queres de mim agora?
Mas, antes, deixa-me felicitar-te
A fumacinha branca te elegeu
Pra liderar a casa do Senhor;
E como não sou religioso,
Melhor foi você do que eu.

Meu velho amigo, Ferraz,
Há mais de dez dias não durmo;
Sei que a votação me elegeu,
E já, de lá, não tenho é paz.
É um um protocolo besta aqui,
É tanta cerimônia acolá
Que eu já nem sou mais eu.

Já tô tendo é muita gastura,
E nem sei como te falar:
O amigo pinta ainda? “Decime, Che“,
Diga que sim, que pinta. Me alegre.
E não faça como Cristina,
Penso modificar totalmente a pintura,
De toda a Capela Sistina.

Mas Chico, agora ficaste foi louco?
Há mais de 500 anos, Michelangelo a capela pintou,
É um afresco tão maravilhoso
Que não se deve apagar,
Nada seria igual: nem Picaso, Debret, Renoir,
Do rococó ao barroco e neo-clássico;
Melhor é deixar como está.

Ferraz, você sabe que sou humilde,
A pintura da Capela, isso sim, vou mudar,
Quero algo bem mais moderno,
Que mostre o mundo atual,
Para Jesus, o Redentor,
Será você, não duvide,
Da nova Capela, o pintor.

Quero suas idéias astutas,
Tudo, na Capela, bem retratado,
Nao importa que seja por cima,
De qualquer canto ou dos lados;
O importante é que a cúria veja
Que reis e rainhas vivem,
No mesmo santo solo, com putas.

Oh, Xenti... E quando eu começo?
Vou colocar meu talento e empenho,
Pois quero que os fiéis vejam,
No final, o meu humilde desenho,
Vou pintar o meu Brasil querido,
Aqui bem do lado esquerdo,
Reativando o quengo de conterrâneos esquecidos.

Não vou pintar o Império,
Nem Deododo, no começo da República,
Nem os quinze anos de um governo provisório
Pois aqui o negócio é sério;
Também não pinto a ditadura,
Que terminou com Figueiredo,
Isso não é realidade; isso só é uma pintura.

Vou pintar, sim, Maluf, o pobretão,
Pedindo votos, com bravura,
Pra fazer rodovias em São Paulo,
E por baixo de seu colchão;
Pinto Serra, pinto Erundina e Marta,
Só não pinto Celso Pitta,
Por ter pouca tinta escura.

Um pastor pedindo esmola
Mais arriba, vou pintar, também,
Com uma sacola cheia na mão,
A generosa esmola foi tanta
Que comprou até “televisão“
Pois quem nasce pra Pataca, (Babaca)
Nunca chega a ser Vintém. (Alguém)


Pinto ACM, acima, rei do povo da Bahia,
Pinto Gil, Caetano e Gal,
Ivete, com um lindo chapéu de palha
Pinto papai, meus primos e tias
Pinto, enfim, a familia inteira,
Só não me esqueço de Caymmi,
Indo pra Maracangalha.

Não poderia deixar de pintar,
Ela tão doce e tão amável
Que nos Estados Unidos mostrou,
O que é que a baiana tem.
Cantou o samba brasileiro,
Carmem, a ti, com carinho, 
Nossa “Pequena Notável“.


Pouco mais assim ao norte,
Pinto, da Igreja, o padre Cícero,
Pinto, também, Frei Damião,
O roubo da sanfona branca, não esqueço,
Da “Asa Branca, pinto o vôo,
Que foi o brilhante começo
De Gonzaga, o Rei do Baião.

Não posso deixar de pintar Elba,
E nem Fagner, com Carinho,
Só pinto com muita tristeza,
A doença de Dominguinhos,
Mestre ilustre da sanfona,
Que se for desta, estará no céu,
Ao lado de sua Alteza.

Pinto, sim, é Chico Anísio,
Que nos deixou ano passado,
Com seus tantos personagens,
Será um espaço bem engraçado,
Amigou-se com a comédia,
E só mudando de roupagem,
Com várias mulheres foi casado.

“Dr. Jânio foi-se simbora,
Dizendo eu volto de novo,
Jogou a vassoura no lixo,
Enfiou o cabo no povo“
Vocês sabem quem pinto agora?
Sarney, que muito mais que Dr. Jânio,
Tem um bigode de lei.

Pinto toda nossa linda flora,
Do Rio Negro ao Alto Xingu,
Pintando pra quem não sabe,
Que peixe de escamas é pirarucu,
Que tapioca e muito boa,
Mas sou mais do camarão,
Ensopadinho com xuxu.

Pinto o calango do cerrado,
Que se rasteja pelo chao,
Parecendo até deputado,
Que pra levar tanto dinheiro,
Que não cabe em vinte mãos,
Usa três cuecas com bolsos
Bem por baixo de um calcão.


Preciso aqui mais deste lado,
De muito mais espaço, acredito,
Pra colocar tanto deputado,
E um exagero de partidos,
Não sei se estarei errado,
Mas se pinto tudo deste lado,
Já não pintarei mais bandidos.

Pinto mares, pinto serras, 
Pinto todo o bosque em flor, 
Pinto um céu azul de anil,
Mas aqui, não  pinto  é  guerra,
Por estar pintado o Brasil.
Pinto o verde da esperança,
E um povo cheio de amor.

Pra pintar o Juiz Barbosa,
Escureço  é  mais o pincel,
Pinto parte do legislativo,
Do executivo e até judiciário,
Só não vou pintar aqui,
Juiz Lalau, o temerário,
Por não ter credencial  no céu.

Mensalão, isso pinto mesmo não
Por pouco espaço na capela,
Pois se começasse eu a pintar,
Sairia muita gente voando,
Pelas frestas da Janela,
Não teria tinta e pincel no mundo,
Pra retratar tamanha tela.

Praia em São Paulo,  não tem:  é uma pena,
Cimento armado nunca foi areia,
E lá não pintei sereias da pele morena,
Se pudesse cair neve no Rio
Pintaria louras de tirar o chapéu,
Se chovesse no nordeste,
o meu Brasil seria o céu.

Ainda não pintei Chacrinha,
Nem Silvio, nem Raul Gil,
Faustão requer muito espaço,
Que só fazendo reducão,
Pinto Hebe, a lourinha,
E não esqueço de Boldrin,
O homem do “Sr. Brasil“.

Já nem sei mais o que fazer,
Pintei no Rio, o grande Cristo,
No alto do Corcovado,
Na Serra dos Órgãos, eu pintei,
“Dedo de Deus“ enganado,
Pois ao invés do indicativo,
Pintei foi o dedo errado.


Que buraco é aquele lá no meio,
No ponto mais alto da Capela
Não vai me dizer que esqueceu“?
Claro que não, é evidente,
Pinto lá mesmo é Lula,
Com um litro de aguardente,
Por se acaso, nos falte Deus.


De: Luiz Ferraz
Em: 19 de março de 2013.

domingo, 10 de março de 2013

O ESQUENTAMENTO DA MULHER

O esquentamento da mulher...

No dia internacional da mulher,
A “chama“ ficou muito bem acesa
Com elas subindo pelas paredes,
Ou bem atrás de um “pé de mesa“
Durante todo o dia oito
E a maioria de “mané“ besta
Sem conseguir “molhar o biscoito“.

É que o fogo de uma mulher,
Com sua “chama“ bem ardente,
Faz soldado virar “cabo“
E praça virar tenente,
E ser queimado pela “tocha“
É desejo de muita gente.

Mas só pode falar de fogo
Quem com ele já se queimou,
Tem muito cabra falando tanto,
E nesse caso sou eu o doutor;
Falam que seu corpo ta ardido
E nem perto da fêmea chegou.

Pra aproveitar bem a festa,
Do bolo se come é tudo,
Até os docinhos do lado,
Sem perdoar um brigadeiro.
Mas tem cabra se achando é macho,
Pois da massa não come é nada,
Muito mal um pedacinho do recheio.


De: Luiz Ferraz
       Dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2013

quarta-feira, 6 de março de 2013

A VIDA NOS LEVA

A vida nos leva

Minha mão já nem mais alcança,
Cabelos brancos e de rugas, estou cheio,
Os pés caminham, já não no compasso da chinela,
Para chegar em um futuro, enfim, sem esperança,
Já que minha mente anda tão fraca,
De tanta tristeza que bate nela.

Hoje, se vai um; outro amanhã nao virá,
A prosa se reduz até não ter quem contar, 
Diz Pandora da caixa: “A esperanca está nela?
No caminho me viro e não vejo nada acolá,
Meus braços velhos e cansados se afundam
Na ausência que só eu vejo, no batente da janela.

Meu amigo se foi ontem e nos deixou,
Amanhã, outro irá, também, e nos deixará, eu sei.
Outros chegam, se incorporam. É a lei que na vida impera;
Na realidade, viverão só de contos que o tempo não levou.
Com parecidos condimentos, temperos de alegria e dor,
Mas quão diferente ficará o cozido feito em outra panela.

Olho bem mais pro meu velho passado,
Nele corro mais e o que não me faltará é tempo;
E sigo em frente porque lá bem atrás vem ela,
A vida que nos acaba e nos leva ao fim.
Começo e choro com as dores de um parto,
Termino e choro de saudade da vida que me foi tão bela.



De Luiz Ferraz
Em: 6 de março de 2013.
Homenagem: Vigésimo quinto aniversário da morte de papai, em 11 de março 
                   de 1988.


quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

UM REINADO

Um reinado

Quem pôde ver, até duvidou,
Quem não viu, custou para crer
Que um filho e uma mãe,
Com tantas passagens de dor,
Viveram em um mesmo reinado,
Feito somente de amor.

Um reinado com tristezas
Mas cheio de felicidade,
Uma caminhada só de beleza
Pelas ruas de uma saudade,
Um andar só de puresa,
Ao lado da majestade.

Foi toda uma vida em reinado,
Como em todo reinado, uma dor,
E em toda dor, um sentimento,
Sem batalha, luta ou rancor
Que uma linda rainha mãe,
Pra um filho, o trono deixou.

Um reino que foi construído
Com as mãos de uma fada,
Com um coração de veludo,
No corpo de uma coitada,
Pois quem tem mãe, tem tudo,
Quem mãe não tem, não tem nada.

De: Luiz Ferraz
       Em homenagem a minha mãe Dalva, minha deusa, em 15 de janeiro de 2013.